Rótulos na frente das embalagens auxiliam escolhas mais saudáveis

Alimentação
06 de Junho, 2022
Rótulos na frente das embalagens auxiliam escolhas mais saudáveis

No próximo mês de outubro, os brasileiros irão encontrar novos rótulos nutricionais em alguns produtos alimentícios: uma lupa que indica se o alimento tem alto teor de sódio, açúcar ou gorduras saturadas. Trata-se do rótulo nutricional de frente de embalagem ou Front-of-package (FoP). Em 2020, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou a lupa como desenho de rótulo de FoP. 

Um estudo conduzido pela Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP e pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) comparou o comportamento e percepções do consumidor frente ao design proposto pela Anvisa e ao rótulo com o triângulo de advertência, modelo desenvolvido pelo Idec em parceria com designers de informação da Universidade Federal do Paraná (UFPR).

Nos testes, o design da Anvisa apresentou um desempenho ligeiramente melhor em diminuir as intenções de compra dos consumidores. Na maioria dos outros critérios, porém, o triângulo de advertência performou melhor. Por exemplo, ao ajudar o consumidor a identificar o mais saudável entre dois produtos. “Queríamos gerar evidências e realmente ver como se comportava a proposta da Anvisa, em comparação com o triângulo de advertência”, explica ao Jornal da USP a pesquisadora Neha Khandpur, do Departamento de Nutrição da FSP, ressaltando a necessidade de estudos futuros para resultados mais conclusivos. “Poderia haver uma opção melhor para a Anvisa escolher. Mas como vimos alguns aspectos positivos do rótulo em nosso estudo, estamos cautelosamente otimistas”, complementa.

Front-of-package (FoP)

Front-of-package (FoP) é recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) pois dá destaque às principais informações nutricionais de um produto, trazendo-as para a parte frontal da embalagem. A visibilidade dada a essas informações ajuda o consumidor a identificar ingredientes que podem interferir na escolha da compra.

Para que os rótulos nutricionais possam auxiliar na escolha dos consumidores, é importante que o FoP cumpra alguns requisitos. Por exemplo: seguir o tamanho mínimo, ser posicionado de maneira padronizada nas embalagens e usar critérios rigorosos para determinar quando os nutrientes exibidos estão em excesso.

A rotulagem nutricional frontal será obrigatória nos alimentos embalados na ausência do consumidor que tiverem adicionados açúcares, gorduras saturadas ou sódio em quantidades iguais ou superiores aos limites definidos pela Anvisa.

Leia também: Entenda o que significam os ingredientes presentes nos rótulos de bebidas

Avaliação

Cerca de 1.300 pessoas, de 101 cidades brasileiras, participaram do estudo randomizado controlado realizado em outubro de 2019  — ano em que o rótulo foi proposto —, com entrevistadores treinados e de forma presencial. “Esse é um desenho de estudo muito poderoso que isola e demonstra o efeito causal do FoP, sua utilidade, o quão bem os consumidores o compreendem e como influencia as intenções de compra”, esclarece Neha.

Os participantes foram divididos em dois grupos. O primeiro teve contato com produtos contendo o rótulo da advertência, e o outro, com a lupa da Anvisa. Os participantes de ambos os grupos foram questionados sobre os efeitos desses rótulos. Por exemplo: qual era importância da informação comunicada pela embalagem e a utilidade do rótulo no direcionamento de escolhas mais saudáveis. Além disso, questonaram o quão preocupados eles ficariam se crianças da família consumissem alimentos e bebidas com esses rótulos.

O rótulo triangular e o retangular foram exemplos de imagens usadas no estudo – Foto: Arquivo pessoal/Neha Khandpur

Rótulos nutricionais: Estudo

Eles também viram diferentes embalagens de produtos e responderam quais ingredientes estavam em excesso. Em outro momento também tiveram de escolher o produto mais saudável entre um mesmo tipo de alimento, porém de marcas diferentes. 

Por fim, analisando as respostas dos participantes, foi possível concluir que ambos os designs tinham efeitos semelhantes na comunicação de informações de nutrientes. Os resultados foram: 57% do rótulo triangular contra 54% do recomendado pela Anvisa.

“O estudo mostrou que os consumidores consideraram, sobretudo, o triângulo FoP uma ferramenta útil. De acordo com eles, ela comunica informações importantes e mostra ser o modelo mais fácil de compreender em comparação com o FoP da Anvisa”, aponta Neha. Essa preferência da forma triangular está relacionada ao fato de já ser um símbolo comum em placas de trânsito e avisos de “cuidado” ou “atenção”. Por outro lado, o FoP da Anvisa teve um desempenho melhor no incentivo às intenções de compra dos consumidores. 

O estudo mostrou também que o preto e o branco contrastante dos avisos, a localização dos rótulos nutricionais na embalagem e o tamanho grande são características presentes nos dois tipos de designs que se mostraram importantes na captura da atenção do consumidor. Neha acrescenta que essa inconsistência dos resultados, ou seja, a falta de estabilidade na performance dos designs, ainda não pode ser explicada com o estudo atual.

“Foi um dos primeiros estudos a comparar esses dois modelos. E também demonstrou alguma utilidade do desenho da Anvisa para a população brasileira”, comenta Neha sobre a importância da publicação do artigo. Segundo ela, a Anvisa revisou mais uma vez o seu design após a versão ter passado pela a avaliação no estudo, ainda que não tenha dado um retorno direto às pesquisadoras. As orientações finais sobre o uso dessa rotulagem estão disponíveis neste link.

Política Nacional de Alimentação e Nutrição

A aprovação da lupa como rótulo em 2020 é parte da Política Nacional de Alimentação e Nutrição, regulamentada pela Anvisa, que busca reduzir os índices de sobrepeso, diabete e doenças degenerativas associadas a hábitos alimentares. Essas doenças já são um problema no cenário brasileiro. Em 2021, por exemplo, mais da metade da população do país estava com sobrepeso. Com a nova rotulagem que teve definição da Anvisa e que as empresas alimentícias deverão usar como padrão, será mais fácil para o consumidor compreender o que compõe os produtos, comparar os alimentos e, assim, fazer uma escolha mais saudável. 

Esse rótulo, que irá para as prateleiras em outubro deste ano, gera controvérsias desde sua aprovação. Na ocasião, o Idec considerou o modelo insuficiente. Assim, ele propôs a adoção do modelo de triângulos, desenvolvido em parceria com designers de informação da Universidade Federal do Paraná (UFPR).

O modelo de triângulos, além de estar ligado à ideia de advertência, apareceria repetidamente. Isso caso mais de um ingrediente estivesse em excesso (açúcar, sódio e gordura saturada). Diferentemente do que ocorrerá no modelo aprovado pela Anvisa, no qual a lupa aparecerá apenas uma vez, independentemente de quantos ingredientes estão em excesso.

Rótulos nutricionais em outros países

Em 2016, o Chile foi o primeiro país a adotar um modelo de rotulagem frontal. O país utiliza o símbolo de um octógono em preto e branco, que também remete à ideia de advertência do triângulo proposto pela UFPR,. Este que, inclusive, teve inspiração no modelo utilizado no Chile. Estudo publicado pela revista The Lancet  já mostrou uma redução significativa no consumo de produtos com o alerta chileno. Além disso, outros países da América Latina, como o Uruguai, o Peru e o México, também utilizam o modelo do octógono. 

Fonte: Jornal da USP

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