Paracetamol pode trazer riscos ao feto, alertam pesquisadores
Mulheres grávidas devem tomar cuidado com o paracetamol, priorizando a menor dose eficaz e apenas sob orientação médica. Isso porque uma nova recomendação alerta para possíveis danos ao desenvolvimento do bebê.
A recomendação foi publicada no periódico Nature Reviews Endocrinology. Assim, foram revisados estudos publicados nos últimos 25 anos e que associam a medicação a eventos adversos. O uso da droga foi associado a um risco aumentado de problemas no neurodesenvolvimento da criança, como Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), Transtorno do Espectro Autista (TEA) e problemas na aquisição de linguagem. Além de malformações genitais, com problemas reprodutivos e até infertilidade.
Os estudos não são conclusivos e não comprovam uma ação direta do paracetamol. Contudo, as evidências observadas foram consideradas suficientes para que o alerta fosse emitido, segundo Anderson Martino Andrade, professor do Departamento de Fisiologia da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e um dos autores do consenso.
“Apesar das incertezas, decidimos publicar o alerta porque o paracetamol é uma das poucas alternativas na gestação, e é entendido como um medicamento de baixo ou zero risco por muitas mulheres e até profissionais da saúde”, explica o especialista.
Dessa maneira, o paracetamol tem ação analgésica, contra dores moderadas, e antitérmica. Além disso, seu ingrediente ativo está presente em mais de 600 medicações. De acordo com o levantamento feito pelos pesquisadores, 65% das mulheres grávidas nos Estados Unidos utilizam o medicamento. No Brasil, segundo Andrade, o cenário é semelhante.
“Cerca de 60% das mulheres no início da gestação fazem uso do remédio no Brasil. Analisamos as mulheres no início do período, mas se contar a gestação inteira, talvez seja até maior”, cita o especialista.
Gestantes devem suspender o paracetamol?
Não há remédios alternativos para as grávidas, portanto, o consenso dos especialistas não prevê uma suspensão imediata do medicamento. Segundo Leonardo Pereira, professor da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto da USP, as opções disponíveis atualmente são consideradas ainda mais arriscadas às gestantes.
“Se ela tiver uma dor ou febre, não se pode prescrever a aspirina. Da metade para o fim da gestação, essa medicação acelera o parto. E a febre e a dor podem ter efeito mais danoso no feto do que o paracetamol, como problemas cardíacos e malformação do tubo neural”, descreve o especialista, que também é membro da Associação Brasileira de Ciências Farmacêuticas.
Os riscos associados a esses sintomas durante a gravidez também foram levados em consideração na análise dos especialistas que formularam o consenso, segundo Anderson Andrade. “A recomendação é que o paracetamol seja usado nessas situações em que há necessidade médica, mas não com uma dor leve que poderia ser tratada de forma não farmacológica ou que passaria sem nenhum tipo de intervenção. O objetivo é deixar o uso do paracetamol restrito aos casos em que a indicação é necessária”, reforça.
Também não basta encontrar uma alternativa que seja apenas segura, de acordo com o professor de Ciências Farmacêuticas. É preciso que ela atenda a todos os critérios da Organização Mundial da Saúde (OMS) para um “medicamento essencial”.
Segundo Pereira, trata-se de um medicamento que está disponível para a população, é seguro e efetivo, com menor risco de reação adversa e com baixo custo de tratamento. “Não adianta, no lugar do paracetamol, usar outro antitérmico que custa 500 reais e vem oito comprimidos. Ninguém vai tomar”, detalha.
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Anos de uso não garantem segurança
Uma das críticas que os mais de 90 signatários do consenso receberam foi que o paracetamol é usado há anos e os efeitos descritos não são observados na prática. Segundo Andrade, como os desfechos são, em geral, sutis e se apresentam muitos anos após o nascimento, nem sempre é fácil associá-los à medicação ingerida na gestação.
“Estamos falando de Déficit de Atenção e Hiperatividade, distúrbios ou problemas na aquisição de linguagem das crianças ou alterações reprodutivas que, às vezes, podem se manifestar lá na frente, com a infertilidade na idade adulta. São efeitos difíceis de serem rastreados, mesmo em remédios disponíveis há muito tempo”, afirma.
Os estudos que pretendem analisar o impacto de um medicamento não são feitos com gestantes, visto que não se pode colocar em risco a vida da mãe ou do bebê. “Então temos que nos apoiar em estudos observacionais, olhar para indivíduos que fizeram ou não uso do remédio, possíveis efeitos associados e tentar estabelecer uma relação”, explica Andrade.
Mas, apesar dos resultados não conclusivos, o pesquisador disse que a maioria dos estudos analisados pelo grupo ia na mesma direção. “Boa parte apontava os riscos de neurodesenvolvimento, o que reforça que esses efeitos sejam, de fato, reais. Mas precisamos de mais dados para ter uma resposta mais definitiva”, completa.
(Fonte: Agência Einstein)